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Por David Nemer
Nas últimas semanas, uma série de campanhas nas redes sociais, principalmente no Twitter, lideradas por figuras proeminentes da esquerda, ditou a agenda dos debates online não só na bolha progressista mas também na bolsonarista.
A primeira campanha começou logo após o encerramento do primeiro turno, em que se tentou associar o candidato Jair Bolsonaro (PL) à maçonaria e ao satanismo. No dia 4 de outubro, os termos MAÇONARIA e MAÇOM foram citados mais de 1 milhão de vezes no Twitter. Segundo análise do analista de redes sociais Pedro Barciela, a campanha ocupou um maior espaço por 48 horas do que a contra defensiva dos bolsonaristas.
A segunda campanha veio logo em seguida, no dia 5 de outubro, e tentou associar Bolsonaro à práticas canibais depois que um vídeo do candidato dizendo que cometeria canibalismo viralizou no Twitter ocupando os Trending Topics (assuntos mais comentados) durante o dia todo. A terceira e mais recente campanha fez da hashtag “Bolsonaro é pedófilo” uma das mais compartilhadas no Twitter no dia 15 de outubro. A campanha reagiu a uma declaração do candidato Bolsonaro de que “pintou um clima” entre ele e meninas venezuelanas de 14 e 15 anos em entrevista a um podcast.
Nos dois casos, decisões do TSE impediram a veiculação de campanhas do PT sobre os temas.
O Brasil não é o Twitter
Apesar das campanhas online com esses temas dominarem os debates no Twitter, muito se indaga sobre o real impacto dessas campanhas e se realmente alcança um eleitorado para além da plataforma. Essa tem sido uma crítica que tenho reforçado: “O Twitter não é o Brasil. O Brasil não está no Twitter”.
No ranking de usuários ativos brasileiros nas redes sociais, o Twitter ocupa apenas o 9o lugar com 19 milhões de usuários, e é liderado pelo WhatsApp com 165 milhões de usuários.
É justamente nos aplicativos de mensagens que é possível ter uma noção melhor se de fato as campanhas do Twitter alcançaram o eleitorado do Bolsonaro. O WhatsApp se encontra em 99% dos celulares no Brasil e o Telegram se encontra em 65%, e é nessas plataformas que bolsonaristas se manifestam de forma mais orgânica em seus grupos. Segundo análise da consultoria Palver, pela primeira vez desde o início da campanha os “Ataques contra Bolsonaro” ultrapassaram os “Ataques contra Lula” no WhatsApp.
Já nos 122 grupos bolsonaristas no Telegram que monitoro no Sentinela Eleitoral, o termo “maçonaria”, que costumava ser citado entre 2 a 5 vezes por dia, foi citado em mais de 600 mensagens.
Por sua vez, a campanha que tentava associar Bolsonaro ao canibalismo não atingiu o Telegram bolsonarista da mesma forma que a “maçonaria” atingiu – mas é possível falar que ela também chegou a esses círculos.
Nos últimos 10 dias, o termo “canibal” ou “canibalismo” foi citado nenhuma ou uma vez por dia. Já no dia 05 de outubro, foram 20 vezes.
“Pedofilia”
Já a campanha que ligava Bolsonaro à pedofilia atingiu em cheio os 122 grupos bolsonaristas no Telegram. Isso porque o tema da pedofilia sempre foi uma arma dos bolsonaristas para acusar e demonizar seus oponentes – ou seja, é um assunto que é sempre discutido nesses espaços.
No dia 12 de outubro, Dia das Crianças, muito se debateu o caso em que a ex-ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, sem qualquer comprovação, comentou sobre o tráfico de crianças no Marajó: foram 206 mensagens em 122 grupos amplificando os comentários da futura senadora, em claro apoio à história – a respeito da qual o Ministério Público pediu esclarecimentos, aliás.
Já nos dias 15 e 16 e hoje, o tom mudou.
Houve uma tentativa intensa de se criar uma narrativa para justificar a fala do Bolsonaro: foram 126 mensagens. A que mais circulou foi um tweet atribuído a Flávio Bolsonaro tentando amenizar a fala do pai, acusando a esquerda de fake news ao associar o termo “pintou um clima” à pedofilia.
Analisando esses dados do WhatsApp e Telegram, é possível afirmar que as campanhas anti-Bolsonaro no Twitter também pautaram os grupos bolsonaristas, ou seja, foram além de uma plataforma mais exclusiva, que é o Twitter, e dominaram o debate em plataformas mais populares como WhatsApp e Telegram.
Com isso, cria-se uma expectativa que tais campanhas tenham um potencial para virar votos dos apoiadores do presidente. Porém, como analisei diversas mensagens nesses grupos reagindo às campanhas, o tom era de defensiva – ou seja, um intenso movimento para produzir conteúdos para defender o seu candidato Jair Bolsonaro e não havia qualquer manifestação de mudança de voto. Isso fica evidente nas últimas pesquisas de intenção de voto no 2o turno onde Lula caiu 1%, para 52% e Bolsonaro subiu 1% para 48% dos votos válidos.
Contudo, um dos efeitos que tais campanhas têm nos grupos bolsonaristas, assim como no Twitter, é que, ao pautar o debate no espaços bolsonaristas seus apoiadores se ocupam em defender o presidente em vez de investir esforços e tempo para controlar o debate e promover ataques aos seus opositores assim como campanhas pró-Bolsonaro.
Um outro possível efeito é, devido à intensidade e ocupação das campanhas anti-Bolsonaro nas redes, desmotivar a sua base a sair de casa e votar em Bolsonaro. Estudos mostram que campanhas que minam a credibilidade de um candidato tendem a desmotivar a sua base.